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Airbnb dá dinheiro? Só se você tiver paciência, estratégia e sorte

Eu estava dando uma palestra sobre finanças quando uma senhora muito simpática me puxou no final, animadíssima, e contou: “Tô pensando em investir em Airbnb, vou dar uma entrada de R$ 40 mil, depois fica uma parcela de R$ 3 mil por mês e vou tirar R$ 6 mil fácil, alugando todo fim de semana por R$ 1.500”. Fez até a conta sorrindo.

Ela já era mais velha, falava com tanto entusiasmo que não tive coragem de cortar o clima com um “ihhh, melhor rever essa projeção aí, dona Maria…”. Preferi só sorrir e pensar: quantos brasileiros estão caindo nessa ideia de Airbnb como investimento infalível?

E se eu te contar que não é bem assim? Bora entender porquê.

Como investir em imóvel para Airbnb?

Investir em um imóvel para aluguel por temporada é bem diferente de alugar para moradia tradicional. A ideia é comprar (ou financiar) um apartamento, estúdio ou casa e anunciá-lo no Airbnb ou similares, como Booking ou Vrbo. Ao invés de um inquilino pagando um valor fixo por mês, você lucra com diárias, geralmente maiores, ao longo do mês. Em teoria, mais rentável. Na prática? Menos garantido, e é importante verificar se seu condomínio permite.

Parece uma renda passiva de cinema: você acorda, olha o app e vê que alguém já reservou o apê pro próximo fim de semana. Mas no fundo, o Airbnb virou um negócio ativo, com trabalho de marketing, atendimento ao cliente, logística de limpeza, manutenção e uma concorrência pesada de gente fazendo igual ou melhor.

Os números que ninguém te conta, mas deveria

O grande apelo do Airbnb como investimento está na promessa de retorno mensal alto. Só que essa conta, muitas vezes, é feita com base na ocupação máxima possível, sem considerar que você vai ter dias (ou semanas) vazios. Imagina depender que todos os finais de semana tenham hóspedes, e que todos paguem o valor cheio?

Vamos fazer a conta da senhora da palestra. Supondo que ela consiga mesmo alugar quatro finais de semana por R$1.500 cada, temos R$6.000 de receita bruta. Mas aí entra:

  • Taxa do Airbnb: 3% para você, anfitrião.
  • Limpeza: R$200 por vez? Então chegamos em R$400/mês, porque normalmente você cobra uma parte do hóspede.
  • Condomínio (com conta de água) e IPTU: digamos R$450/mês.
  • Financiamento: R$3.000.
  • Internet, luz, reposição de itens, manutenção? Uns R$400/mês.

Fez as contas por aí? Tirando esses gastos, o “lucro” é de R$1570,00… ainda tá bom né? Mas isso contando com a sorte de que vai alugar todo fim de semana, se não alugar em um, só sobra R$70,00. E isso sem ter nenhum gasto a mais seja com manutenção, ou até mesmo aquela conta de luz alta no final do mês.

No fim, de “quase o dobro”, o tal investimento pode virar “quase zero”. E nem começamos a falar de ocupação real, que gira em torno de 50 a 60% ao mês (de acordo com Airbtics, para cidade de São Paulo), especialmente fora de regiões turísticas ou em baixa temporada.

Airbnb não é só renda: é um trabalho

Ser anfitrião exige muito mais do que deixar a chave na portaria. Você precisa responder mensagens rapidamente, resolver imprevistos (desde entupimentos até hóspedes que fazem festa clandestina) e manter o lugar sempre impecável, como se fosse um hotel boutique, mas sem equipe.

E se você acha que vai contratar uma empresa de gestão para isso, prepare o bolso: boa parte da sua renda vai para pagar essa comodidade. A alternativa? Virar um pequeno empresário do turismo sem perceber.

E a concorrência? Está cada dia maior

Hoje em dia, qualquer cidade minimamente turística tem uma superoferta de imóveis no Airbnb. Em São Paulo, por exemplo, só a região da Paulista tem mais de 1.500 studios listados. No Rio, Copacabana virou praticamente um bairro-hotel. Resultado? Preços em queda, hóspedes mais exigentes, e uma guerra por avaliações cinco estrelas.

Aliás, a própria Airbnb agora mostra ranking de anfitriões, sugerindo primeiro os imóveis com as melhores notas. Se você é novato, boa sorte em se destacar entre quem já tem dezenas de avaliações.

E se o apartamento ficar vazio?

A vacância é o grande fantasma dos investidores no Airbnb. Um mês com 30% de ocupação pode ser o suficiente para colocar seu orçamento no vermelho. E não adianta tentar compensar com preços altos: os hóspedes comparam tudo em tempo real. Se o seu estúdio está a R$300 e tem um igualzinho por R$180 com 50 avaliações, adivinha qual vai ser escolhido?

Sem contar eventos imprevisíveis: cancelamentos em cima da hora, períodos de baixa demanda, greves, crises, pandemias (sim, ainda vale lembrar).

Airbnb virou o novo “day trade do imobiliário”?

Tem gente comprando imóvel só pra colocar no Airbnb do mesmo jeito que, em 2020, teve gente abrindo conta na corretora para virar day trader. No começo, parece que todo mundo está ganhando dinheiro. Mas, passado o hype, descobre-se que rentabilidade mesmo, só pra quem tem escala, localização premium e muita gestão.

Se antes o brasileiro sonhava em viver de aluguel, agora quer viver de hóspede. Mas o risco continua alto, e muitas vezes disfarçado de estabilidade.

Quando o Airbnb vale a pena? Fique de olho no ROI

O retorno sobre o investimento (ROI) em imóveis no Airbnb pode ser interessante em casos específicos, com imóveis comprados à vista, localizados em regiões com alta procura, e bem gerenciados. Mas para o pequeno investidor com pouco capital e financiamento alto, o risco é enorme, você vai ter uma reserva para conseguir manter sua casa e um outro imóvel com todas as contas em dois/três meses, se não alugar?

Os custos fixos e variáveis são grandes, o tempo de retorno pode ultrapassar 10 anos e o mercado está cada vez mais saturado. Pior: boa parte dos investidores novatos não calcula de verdade o retorno. Acham que estão lucrando porque pagaram as contas do mês e ainda sobrou uma pizza.

Dá pra investir com cabeça?

Sim, mas exige planejamento e frieza. Uma boa prática é usar simuladores como o da Airbtics ou AirDNA, que mostram a média de ocupação e retorno estimado por região. Outra é considerar a revenda do imóvel, caso a estratégia do Airbnb não funcione. Mas atenção, um estúdio em bairro saturado não é fácil de vender depois.

Também é possível diversificar: começar alugando por temporadas maiores (mensais), reduzir o número de hóspedes diferentes e diminuir o estresse. Ou, quem sabe, buscar formas de renda passiva menos trabalhosas, como investimentos em renda fixa ou até se aventurar na renda variável.

Conclusão: Airbnb é investimento ou cilada com check-in?

No fim das contas, o Airbnb pode sim ser uma fonte de renda. Mas está longe de ser uma fórmula mágica para ficar rico. É um negócio, e como todo negócio, exige capital, gestão, risco e tempo.

Para quem acha que vai comprar um imóvel e ver o dinheiro cair na conta sem fazer nada, o choque pode ser forte. Especialmente se você baseou sua expectativa em um fim de palestra e um cálculo otimista feito de cabeça.

Então, antes de sair comprando um estúdio achando que três mil vão pingar todo mês, lembre-se: até na praia mais badalada, tem temporada de chuva.

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