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Pagamento à vista ou no cartão de crédito: sabemos a diferença?

A impossibilidade de diferenciar o valor cobrado entre o pagamento à vista e no cartão de crédito protege o consumidor? Parece que sim, meu caro amigo leitor. Só que não. Vamos ver por quê?

 Antes de tudo, vale contar o que entendem as autoridades. Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou que configura prática abusiva a cobrança de preço diferente do mesmo produto ou serviço para pagamento à vista ou no cartão de crédito. Segundo o STJ, o pagamento pelo cartão de crédito configura modalidade de pagamento à vista, recebendo o consumidor quitação integral da transação, assumindo a administradora do cartão a inteira responsabilidade pelos riscos da venda. Portanto, a prática seria abusiva, com base no art. 39, V e X, do Código de Defesa do Consumidor e no art. 36, X e XI, do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência.

 Uma primeira questão, meu caro leitor, é que as modalidades de pagamento têm custos diferentes. Veja: se você faz uma compra de R$ 1.000 hoje, dia 17 de novembro, e paga à vista, o lojista recebe imediatamente. Se você faz esta mesma compra pagando com cartão de crédito, o lojista não recebe imediatamente. Ele recebe – na maior parte dos casos – 30 dias depois e ainda paga uma comissão. Essa taxa gira em torno de 2%, só para arredondar. Ou seja, no cartão, o lojista irá receber R$ 980 e somente em 17 de dezembro.

 O lojista que recebeu à vista poderia ainda aplicar o valor recebido. Suponhamos que ele optasse por um título do governo, pagando o título juros de 1% ao mês. No final de um mês, o lojista teria R$ 1.010. Ah, temos que adicionar ainda a comissão que ele pagaria se recebesse no cartão, de 2%. Opa! Uma bela diferença de quase 3% entre o pagamento à vista e o pagamento com cartão de crédito. O valor econômico é diferente e impacta nos preços. Impacta como?

 Aqui a segunda questão. Se o lojista pudesse fazer a diferenciação, ele seria incentivado a ofertar o produto ou serviço revelando exatamente o seu custo (a modalidade de pagamento é uma medida do custo). Como ele não pode fazê-lo, razão da decisão do STJ, ela opta por uma espécie de subsídio cruzado (que nome feio!). Simples: o consumidor que paga à vista banca parte da conta de quem paga com cartão de crédito.

 Vejamos: se o lojista vendesse 200 produtos, 100 à vista e 100 no cartão, com preços diferenciados, R$ 500 para pagamento com dinheiro/cheque e R$ 510 para pagamento com cartão. No final do mês, ele teria como receita R$ 101.000. Mas como ele não pode fazer a diferenciação, para alcançar a mesma receita no final do mês, uma opção seria encontrar um preço de equilíbrio, intermediário. Num cálculo simples: o produto agora custaria R$ 505 para qualquer modalidade de pagamento. Quem paga à vista está financiando quem paga com cartão! E quais seriam as consequências?

 Ora, meu amigo leitor, com um preço único, os consumidores são fortemente incentivados a utilizar o cartão de crédito. Recebem o produto agora e só desembolsam no futuro. Eles não têm qualquer benefício para o pagamento à vista, como o preço menor. E quem ganha com o pagamento com o cartão? As operadoras. Um número mais elevado de transações pulveriza o pagamento da comissão. Ah, e os lojistas também podem perder. É que, com os produtos mais caros, somando-se o custo do pagamento via cartão, pode haver uma redução nas vendas, prejudicando também a sua receita.

 E os consumidores? Estes estarão sempre pagando um valor mais alto pelos produtos e serviços. E aqui ainda tem um efeito mais perverso. Se, de fato, houver maior migração de consumidores pagando no cartão do que à vista, maior será a perda daqueles que optariam por pagar à vista. O preço de equilíbrio discutido acima será maior. E se pensarmos que os consumidores mais pobres são aqueles que pagam à vista, e não possuem cartão de crédito, eles serão os mais prejudicados. Não parece bom, né?

 Para finalizar: o cartão de crédito como meio de pagamento é excelente. No entanto, nós aqui temos dois problemas importantes nessa forma de pagamento: (i) o recebimento no crédito pelo lojista somente ocorre em 30 dias (criação tipicamente nacional, que dará ensejo a outro post futuramente); e (ii) comissões e juros altos – tanto para os lojistas como para os consumidores. Nesse segundo problema, o blog tem atuado fortemente no estímulo de mais concorrência (muito mais). Além de inúmeros post’s, colocou no ar ontem seu comparador de maquininhas de cartão (acesse aqui). Não há maior incentivo concorrencial do que comparar custos.

 Enquanto isso, a (im)possibilidade de diferenciação dos preços joga na contramão…

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